Considerava ser uma mulher desprendida. Sem apegos materiais, afetivos, pessoais.
Não tinha uma biblioteca, porque doava os livros que comprava depois de lidos.
Não guardava cartas, não sabia que era valor sentimental.
Nunca fez uma lista. Nem de caras que já transou, nem de os melhores filmes que já viu.
Nunca escreveu um ranking de nada. Nunca chamou ninguém de melhor amigo.
A agenda telefônica foi programada para ser randômica.
No mercado, comprava de marcas aleatórias, sem ser preconceituosa com preço, elegia cortes diferentes do boi e do porco.
Há quem lhe chamava de "encima do muro". Não votava em um partido, não tinha preferência por um corte de cabelo, lugar para sair, ficava sempre a cargo do outro.
Há quem dizia que era "livre". Poderia ir aonde quisesse, e não sofreria de saudade nem nostalgia.
Mas ela sofria.
O único sentimento que não conseguia largar de jeito nenhum era exatamente essa teimosia de não se prender a nada, nem a ninguém.
Ellen Maria
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