"Já sentiu a angústia durante o gozo, antes mesmo da última gota? O sufocamento. Como se o líquido espesso tapasse a garganta, escorresse pelo lado de dentro do peito, escorando paredes em desalinho.
Tuas mãos na minha garganta. Esse, o acolhimento. Crispadas. Busco teus olhos e os encontro envergados para o bilhete sobre o criado-mudo. Único. Teu nome do meio abreviado, como se perdido num soluço. Talvez o pouco da tua identidade que vai ficar nesse quarto.
Aos poucos o relaxamento. Conformismo. Deglutição. O ar volta a circular, carregado dos cheios de pau e boceta já solitários. Como antes, como antes de tudo, como antes do primeiro adeus. Que era o do primeiro encontro, tudo já começando por terminar. Com um cheiro de morte. Por isso os passeios no cemitério, as flores, a tua mão tapando a minha boca quando a sangria era verborrágica. Não havia tempo.
Não havia tempo.
Não houve tempo.
Há um cadeado sombrio na porta, triste. Entreaberto. Como se senhor da liberdade que ocultamos, um do outro, entre promessas vazias de encantamento. Como o desenlace do pau, um salto para trás, para o entendimento.
Tua boca sem batom. Os olhos esbugalhados, presos na passagem. O nome do meio comido. Um resto de choro que não vale mais a pena.
Já estou vestido. Acabar logo com isso. O corpo, recomposto, dentro das roupas que já me pertenciam, antes de tudo.
O aeroporto, o que é mesmo o aeroporto? O voo do que já vinha distante. Sumir no horizonte qualquer significado, os cabelos armados em um encosto de assento e não mais desalinhados no aconchego.
Um último adeus como promessa de reencontro. Nunca se sabe, retornos são tão plausíveis quanto nascimentos, e olha que nem gozei dentro, ou talvez sim, não sei ao certo porque havia algo de mim que já tinha viajado.
Depois anestesiado, alheio, errático, perdi o tíquete do estacionamento, perdi o carro no estacionamento, lembrei que queria dizer mais alguma coisa, mas já era tarde. Outro filme já devia ter começado, ou talvez estivéssemos apenas ainda dormindo, tuas mãos no meu cabelo.
Qualquer coisa de mim deu partida no carro. Alguém precisa voltar, no caso. Fingindo-se inteiro. Mas com um quê, um tanto de reconhecimento abreviado no meio.
Meu nome, agora? Algum eu, incompleto, entre o que foi e o que ficou, rodando como etiqueta de bagagem na esteira."
Edson Valente R. Maria
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