Simone de Beauvoir estava certa. Nasce-se do gênero feminino, mas ser mulher é uma ação (/estado/essência) que precisa de tempo, consciência, e vários outros fatores, internos e externos. É questão de sentir, lutar e conquistar esse direito. Uma das coisas que me fez pensar nisso essa semana foi um momento ínfimo e discreto na faculdade. Uma discussão tomou forma na aula do mestrado, e entre os dois professores e os quatro alunos, duas posições diferentes foram levantadas. Eu tomei um partido, e outra aluna, aparentemente da mesma idade que eu, tomou outro. A discussão ficou bastante interessante, com argumentos sérios de ambos lados, até que depois de uma fala um pouco confusa da moça, levantei a mão e disse: "Mas aí você está se contradizendo". E comecei a discorrer meu ponto de vista. Ela que, visivelmente, levou para o lado pessoal, fechou a cara e a partir desse momento, passou a contestar qualquer coisa que eu dizia, até bobagens que nem faziam parte do assunto coletivo.
Tornar-se mulher também é tornar-se adulta. Descobri nesse instante: quando percebi que era capaz de não alterar minha postura nem ficar ofendida com ela, quando percebi que não estava interessada em responder as grosserias da menina, que mesmo sendo da minha idade, ainda precisava se afirmar na sala de aula, diante dos outros, e eu já não senti necessidade de nada disso. Saí da sala me sentindo mais velha que ela e também adulta, por fim.
No corredor ainda, quando acabou a aula, me lembrei de um episódio que aconteceu num simpósio anos antes, quando vi uma conferência de um espanhol e uma argentina, ambos já conceituados na área acadêmica. O espanhol levantou hipóteses em sua fala que a mim e a outros na platéia (vi pela cara que uns faziam) pareciam absurdas; eu, na cadeira, comecei a me exaltar, mesmo em silêncio, (já que não podia participar), e entrei em pânico querendo estar no lugar da argentina, para responder de imediato as ideias incoerentes do homem. No entanto, a argentina, mais velha e mais experiente que eu, deixou ele falar o quanto quisesse, e depois, mesmo não concordando em absolutamente nada que ele postulou, respondeu num tom ameno, usando palavras muito educadas, e soube se posicionar num ato de tamanha elegância e que me deixou de boca aberta: ela falou tudo o que eu queria falar, mas da melhor forma possível, e ainda falou de muito mais, que eu não fazia ideia. Saí do simpósio, ao final da conferência, confessando a uma colega que eu nunca poderia ter esse tipo de atitude que a argentina teve, que na verdade eu tinha tido uma vontade louca de pular no pescoço do espanhol, pra mostrar pra ele que era uma loucura tudo aquilo que ele tinha dito. O que minha colega respondeu que um dia eu iria conseguir reacionar como a argentina, e "colocá-lo no lugar dele", disse, que só me faltava mais maturidade e paciência, mas que o tempo se encarregaria de me formar. Na época pensava que minha colega estava enganada, que era alguma coisa de personalidade, que eu sempre seria explosiva e defenderia com unhas e dentes minha opinião.
É... o tempo me mostrou que a enganada era eu. Hoje, ao menos, compreendo, que ser adulta não é só ter correspondência chegando em meu nome, não ter vergonha de comprar camisinha e absorvente na farmácia, decidir meu voto e se esse mês vou menstruar ou juntar uma cartela de pílula com outra. Ser adulta é resolver não comprar uma briga, quando não tem importância, ou saber comprá-la, sem cair do salto.
Ellen Maria
Tornar-se mulher também é tornar-se adulta. Descobri nesse instante: quando percebi que era capaz de não alterar minha postura nem ficar ofendida com ela, quando percebi que não estava interessada em responder as grosserias da menina, que mesmo sendo da minha idade, ainda precisava se afirmar na sala de aula, diante dos outros, e eu já não senti necessidade de nada disso. Saí da sala me sentindo mais velha que ela e também adulta, por fim.
No corredor ainda, quando acabou a aula, me lembrei de um episódio que aconteceu num simpósio anos antes, quando vi uma conferência de um espanhol e uma argentina, ambos já conceituados na área acadêmica. O espanhol levantou hipóteses em sua fala que a mim e a outros na platéia (vi pela cara que uns faziam) pareciam absurdas; eu, na cadeira, comecei a me exaltar, mesmo em silêncio, (já que não podia participar), e entrei em pânico querendo estar no lugar da argentina, para responder de imediato as ideias incoerentes do homem. No entanto, a argentina, mais velha e mais experiente que eu, deixou ele falar o quanto quisesse, e depois, mesmo não concordando em absolutamente nada que ele postulou, respondeu num tom ameno, usando palavras muito educadas, e soube se posicionar num ato de tamanha elegância e que me deixou de boca aberta: ela falou tudo o que eu queria falar, mas da melhor forma possível, e ainda falou de muito mais, que eu não fazia ideia. Saí do simpósio, ao final da conferência, confessando a uma colega que eu nunca poderia ter esse tipo de atitude que a argentina teve, que na verdade eu tinha tido uma vontade louca de pular no pescoço do espanhol, pra mostrar pra ele que era uma loucura tudo aquilo que ele tinha dito. O que minha colega respondeu que um dia eu iria conseguir reacionar como a argentina, e "colocá-lo no lugar dele", disse, que só me faltava mais maturidade e paciência, mas que o tempo se encarregaria de me formar. Na época pensava que minha colega estava enganada, que era alguma coisa de personalidade, que eu sempre seria explosiva e defenderia com unhas e dentes minha opinião.
É... o tempo me mostrou que a enganada era eu. Hoje, ao menos, compreendo, que ser adulta não é só ter correspondência chegando em meu nome, não ter vergonha de comprar camisinha e absorvente na farmácia, decidir meu voto e se esse mês vou menstruar ou juntar uma cartela de pílula com outra. Ser adulta é resolver não comprar uma briga, quando não tem importância, ou saber comprá-la, sem cair do salto.
Ellen Maria
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